Anildo Bristoti, Professor Titular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Lúcio Almeida Hecktheuer,Professor do Centro Federal de Educação Tecnológica de Pelotas
I - Antecedentes até 1700 A. D.
Durante os séculos em que os nossos antepassados eram exclusivamente nômades, a única forma de energia disponível era a dos alimentos. Estes forneciam energia para a manutenção de todas as atividades fisiológicas, inclusive para a forma mecânica-muscular e em especial para o deslocamento e transporte dos filhotes e dos poucos utensílios utilizados na caça e na pesca.
A descoberta do fogo constituiu-se na primeira grande revolução energética na vida do nosso antepassado remoto e ocorreu em diferentes tempos para as diversas tribos que habitavam o planeta. Há indícios de que o homem de Pequim já conhecia o fogo há cerca de 400.000 anos. Com a utilização do fogo teve início a cocção dos alimentos, o aquecimento durante as épocas frias do ano e a iluminação do interior das cavernas, que muito embora se constituísse em abrigos naturais importantes, também poderiam ocultar a presença de perigosos predadores.
As tribos primitivas viviam relativamente isoladas e eram entidades auto-suficientes. As suas eventuais interações com as tribos vizinhas se davam através de eventos esportivos ou atos de agressão. Durante estes intercâmbios não se transacionavam mercadorias, essencialmente por não disporem de tecnologias que permitissem o transporte de cargas em longas distâncias.
A segunda grande revolução energética ocorreu há cerca de 15.000 anos e se chamou revolução neolítica, constituindo-se na descoberta dos animais para tração mecânica. Este fato mudou radicalmente a vida dos nossos antepassados longínquos, pois passaram do estilo nômade para o sedentário. Nasceu a agricultura. Surgiram os primeiros assentamentos humanos permanentes, e, em alguns séculos, brotaram e floresceram as civilizações da antiguidade clássica, principalmente nos vales férteis, tais como o do Nilo, Tigre, Eufrates, Ganges, etc. Um outro desdobramento na utilização da energia de origem biológica e que poderia ser caracterizado como uma "involução" consistiu na utilização do trabalho escravo, como, por exemplo, nos barcos a remo. Este, combinado com a utilização dos animais de tração, permitiu a certos grupos privilegiados dentro da tribo, disporem de alimentos e transporte sem a utilização da energia dos seus próprios músculos.
Inicialmente, esse grupo "eleito" era muito reduzido, ou seja, o grupo dos sacerdotes, porém com a evolução da diferenciação das classes sociais estendeu-se para os militares e para as castas nobres. Os animais de tração e os escravos eram denominados as "bestas de carga".
Dentre as muitas ironias das civilizações da antiguidade, destacamos duas:
1) Atenas, cerca de 700 A.C., abrigava uma população de 500 mil habitantes, porém somente 20% desses eram autênticos democratas; os restantes 80% desempenhavam as tarefas de escravos a fim de que os fiéis depositários dos ideais da liberdade pudessem desempenhar a contento a sua missão;
2) A queda do Império Romano do Ocidente (cerca de 410 A.D.) atribuída às invasões das tribos bárbaras, ocorreu muito mais pelo enfraquecimento interno dos mecanismos de defesa. Havia uma população de escravos tão numerosa em relação a dos nobres e a dos militares que as constantes revoltas dos primeiros consumiram todo o efetivo das tropas, tomando tarefa fácil a conquista e destruição pelas tribos bárbaras, do maior império da antiguidade ocidental. Com a queda do Império Romano e com o conseqüente nascimento do Feudalismo, o sistema de escravatura evoluiu para o da Servidão. Este sistema, onde o feudo tinha que ser uma unidade auto-suficiente, durou em tomo de 1400 anos e só começou a desaparecer com o início da revolução industrial a partir de 1800.
Os transportes durante os períodos da escravatura e do feudalismo não se limitaram somente à utilização das "bestas de carga". A energia associada à água e aos ventos tiveram também contribuições importantes. De todas as formas de energia de origem não-biológica, a dos ventos foi provavelmente a primeira que o homem aprendeu a utilizar, através dos navios à vela. Esta técnica de captação de energia foi continuamente melhorada até o fim do século XVIII, quando foi superada pela máquina a vapor. Os moinhos de vento surgiram muito mais tarde do que a vela, tendo o seu início com o nascimento do Islamismo (século VII) e só apareceram na Europa no século XI em plena era feudal. Inicialmente, os moinhos de vento eram utilizados para moer grãos, mas com o passar do tempo, evoluíram como fonte energética para serrar madeira e bombear água.
O uso de energia hidráulica é documentado na antiguidade clássica, mas a utilização generalizada da roda d'água começou na Europa a partir do século XI. Somente na França, no final do século XVI, existiam 80.000 rodas d'água em funcionamento, atingindo uma potência total de 600 MW.
O século XV, o do Renascimento, marcou também o início das grandes idéias no campo energético que amadureceram e evoluíram para desencadear três séculos mais tarde a revolução industrial. A figura mais destacada deste período foi sem dúvida Leonardo Da Vinci, nascido em 1464 em Florença. Entre as inúmeras invenções deste engenheiro-artista destacam-se a da ponte giratória, a do escafandro, a do barômetro, a do termômetro. Deve-se a ele a constatação da existência de apenas seis máquinas simples (mecanismos de conversão de energias): a alavanca, a roda e o eixo, a roldana, o plano inclinado, o parafuso e a cunha. As possíveis combinações destas seis máquinas são numerosíssimas.
Apesar de todas as descobertas e avanços científicos, a humanidade do final do século XVII continuava a dispor somente das fontes de energia já conhecidas na antiguidade clássica: a de origem biológica, hoje conhecida como biomassa (alimentos, lenha, energia muscular de homens e animais) e as energias do vento e da água. Era bem verdade que os veleiros cruzavam os oceanos em todas as direções, porém o maior pavor dos marinheiros não eram as tempestades, mas as calmarias. Estas quando ocorriam, deixavam os navegadores parados à espera, às vezes, por várias semanas, até que a natureza lhes fornecesse energia para movimentar a embarcação e a viagem tivesse prosseguimento. Isto é, a única forma de energia transportável que poderia ser convertida em mecânica continuava a ser a dos alimentos. Mesmo no final do século XVIII, um navio a remo, dos tempos da Roma Antiga, era capaz de tomar a dianteira de um veleiro inglês.
Obviamente os transportes terrestres sempre tiveram na dependência dos animais de tração. Inicialmente, com as bestas de carga e após um período de tempo muito difícil de ser determinado, surgiu a roda. O homem da antiguidade remota certamente aprendeu a fabricar a primeira roda quando observou um tronco que rolava. Cortando duas secções finas deste e ligando-as por um eixo, teve início o primeiro carro de bois. Com o decorrer do tempo surgiu um novo avanço tecnológico, a roda primitiva adquiriu uma forma de círculo mais perfeita, protegida por aro e com raios que ligavam a circunferência externa ao cubo da roda. Esta roda, mais resistente e mais prática, tomou-se também utensílio de guerra em forma de bigas puxadas por cavalos rápidos.
O sistema de atrelagem dos animais de tração, no caso dos bois, continuou pelos chifres e pescoço. No caso dos eqüinos, a atrelagem completa usando a parte dianteira e traseira do animal só surgiu na Europa a partir do século X. O percurso máximo diário que as diligências do século XVIII alcançaram foi de 50 milhas ou 80 quilômetros, o que é descrito como fantástico por Mary Bronté no seu romance Jane Eyre (Inglaterra de 1830).
Nos países mais planos da Europa, além de serem utilizados os rios para a navegação, foram construídos canais artificiais onde os barcos na contra-corrente eram puxados por cavalos. Na Inglaterra, no final do século XVI, ocorreu uma competição entre o uso da água para movimentar rodas d'água e a utilização para transporte, tanto nos canais naturais como artificiais. No final do século XVII as potências dos dispositivos, tanto animados como inanimados, podiam ser assim resumidos:
- 1 boi.................................................... 0,3 quilowatt;
- 1cavalo................................................. 0,5 quilowatt;
- 1 roda d'água....................................... 1,5 quilowatts;
- 1 moinho de vento...... ... .................... 1,0 quilowatt.
II - Século XVIII - Nascimento da máquina a vapor
Em tomo de 1700, a Inglaterra, a rainha dos mares, se encontrava em uma crise sem precedentes. Desde os tempos remotos a produção do ferro gusa era feita utilizando-se o carbono do carvão vegetal, separando o oxigênio do minério de ferro. Já no século XVI, a lenha, matéria-prima para a produção do carvão vegetal, tomara-se um artigo precioso, pois as florestas da Inglaterra já tinham sido todas dizimadas. O passo seguinte foi utilizar o carbono obtido a partir do carvão mineral para a produção de ferro gusa e aço. Porém, tanto a mineração do carvão como a do minério de ferro, em minas à superficie, estavam praticamente esgotadas após um século de exploração. As minas profundas, alagadas constantemente por águas subterrâneas, tomavam-se inexploráveis.
O Rei Carlos 11 apelou para a Sociedade dos Cientistas Ingleses para encontrar uma solução que permitisse a drenagem das minas profundas. O francês Denis Papin, apresentou à Sociedade Real a primeira máquina a vapor. Despejou água no fundo de um cilindro, ao qual adaptou um êmbolo com haste e aqueceu a água até que ela entrasse em ebulição. O vapor empurrou o êmbolo para cima e ao afastar a fonte de calor, o vapor condensou-se provocando a descida do êmbolo. Seguiu-se, então, a parte mais emocionante da experiência. Papin utilizou uma barra de ferro como uma alavanca articulada na parte central, e ligou uma das suas extremidades ao êmbolo e a outra a um balde. Quando o êmbolo desceu, o balde subiu. Assim, a água poderia ser retirada das minas utilizando simplesmente a energia do vapor e a pressão atmosférica.
Em 1712, Thomas Newcomen, um pastor batista com vocação para cientista, teve a idéia de separar o cilindro da caldeira. A máquina que criou tinha duas torneiras: uma para admitir vapor e outra para admitir água ma que condensava o vapor. A máquina de Newcomen foi utilizada durante 75 anos para extrair água das minas de carvão e chegou a uma potência de 10 quilowatts, o equivalente a utilização de 13 cavalos.
A próxima evolução da máquina a vapor foi efetuada por James Watt, um fabricante de instrumentos. Concluiu ele que a máquina de Newcomen desperdiçava demasiada energia química, isto é, muito carvão para a produção de vapor. A causa principal era a água ma que entrava no cilindro. A saída era utilizar um outro cilindro onde a água pudesse ser condensada permanecendo o primeiro permanentemente aquecido. Assim, nasceu a máquina a vapor munida de condensador. A potência individual desta máquina chegou a 60 quilowatts, um avanço fantástico em relação à máquina de Newcomen. A partir de 1783, todas as máquinas a vapor espalhadas em vários países eram do tipo idealizadas por Watt e passaram a ser utilizadas para a fiação do algodão, para movimentar moinhos, em serrarias, em fábricas de papel, de vidro e cerâmica, inclusive para drenar pântanos e abrir canais. Este tipo de máquina denominada locomóvel teve ampla utilização em todo o mundo, pois mesmo nos dias de hoje é possível encontrarmos dispositivos deste tipo em pleno funcionamento. Um exemplo se encontra em Cachoeira do Sul, no moinho de arroz de propriedade do IRGA.
A máquina a vapor pode ser considerada como a terceira grande revolução energética, pois ela permitiu a obtenção de energia mecânica a partir de fontes de energia inanimadas (lenha, carvão mineral, petróleo, etc.), muito embora essas fontes, nas suas origens, tiveram a presença da vida.
O passo seguinte foi a utilização da máquina a vapor para movimentar trens e navios, mas para isso teve que sofrer importantes modificações para adquirir mais potência e tomar-se mais compacta. Porém, quando isto aconteceu, a humanidade já vivia no século XIX, o glorioso século XVIII tinha mergulhado no passado dando às gerações vindouras o maior dos avanços tecnológicos até então.
III - Século XIX - O Século da Energia
Muito embora os anos 1800 tenham ocupados os seus primeiros quinze anos com as guerras napoleônicas, pode se dizer que durante os 80 anos seguintes a humanidade tenha vivido relativamente pacífica. Mesmo as lutas de independência da grande maioria dos países latino-americanos não passaram de simples escaramuças. Isto se constituiu numa verdadeira dádiva quando comparados com os séculos anteriores e também com a primeira metade do século XX, quando ocorreram os dois maiores conflitos de toda a história da humanidade. Foi nessa atmosfera que nasceu a era industrial.
A utilização da máquina de Watt modificada para movimentar trens e vapores ocorreu simultaneamente na Inglaterra e nos Estados Unidos e está ligada aos nomes de Oliver Evans, John Stevens, George Stephenson, Robert Fulton, Francis Train além de outros. A primeira embarcação a cruzar o rio Mississipi construída por Fulton tinha 45 metros de comprimento e era movida por uma máquina a vapor de 7 quilowatts de potência e podia desenvolver uma velocidade de 16 quilômetros por hora. Dez anos mais tarde, 729 embarcações subiam e desciam o Mississipi, ocasião em que as estradas de ferro passaram a dominar os transportes mecanizados.
A primeira locomotiva construída por Stephenson na Inglaterra deslizou sobre trilhos de madeira forrados com uma tira de ferro e conseguiu atingir uma velocidade de 24 quilômetros horários. Porém, o "cavalo de ferro" como era chamada, tinha a sua frente todos os obstáculos possíveis: as explosões das caldeiras eram freqüentes, fardos de algodão tinham que ser empilhados no carro situado imediatamente atrás da máquina para proteger os passageiros. Os ventos fortes soprando em direção contrária ao percurso da máquina conseguiam pará-la. Os progressos seguintes foram a adoção de dormentes de madeira e trilhos de ferro e aumentou, assim, a potência da máquina e o público começou a apreciar o novo meio de transporte. Os proprietários de diligência, temerosos da concorrência, conseguiram a aprovação de uma lei exigindo que um homem sentasse na frente do trem conduzindo uma lanterna quer de dia, quer de noite, para proteger pessoas e animais.
Em 1830, Stephenson conseguiu a maior façanha, construiu um trem com 45 quilowatts de potência, transportando 38 vagões, um "foguete" que atingiu a velocidade de 56 quilômetros horários. Estava consolidado o transporte ferroviário.
Nos Estados Unidos, Francis Train, em 1869, atingiu com seus trens da Union Pacific a costa da California. Train apostou com seus contemporâneos que poderia dar a volta ao mundo por navio em 80 dias. Conseguiu esta proeza em somente 78 dias e inspirou Júlio Verne a escrever a sua clássica novela.
O século XIX estava reservado à oferta da quarta revolução energética, possivelmente a mais espetacular, versátil e útil de todas as anteriores: a descoberta da eletricidade. Começando com Galvani, Coulomb, passando por Faraday, Ampere, Franklin, Humphry Davy, Oersted, Henry e tantos outros. Não esquecendo a revolução nas comunicações do século passado ligada aos nomes de Morse, Watson e Bell, culminando com as descobertas do telégrafo e do telefone. Apesar de todas estas maravilhosas invenções, as cidades do início de 1880 tinham as suas ruas e casas iluminadas por lampiões e gás, e o transporte feito por carruagens e bondes puxados por cavalos. Nas duas grandes metrópoles daquela época - Londres e Nova Iorque, a poluição provocada pelos dejetos dos cavalos atingia níveis alarmantes (apenas como curiosidade, a cidade ideal criada por Leonardo da Vinci teria dois andares: o de baixo, exclusivamente para transporte e esgotamento sanitário; e o andar superior, para residências, comércio e deslocamento de pedestres - diminuindo, assim, a poluição). Porém era uma poluição que atingia olhos e narizes das pessoas, certamente muito menor do que a provocada pelos gases de exaustão dos automóveis e ônibus nas grandes metrópoles dos dias atuais. Contudo, nesta, embora sejam atingidos em parte os nossos olhos, a grande vítima são os nossos pulmões que infelizmente não são dotados de aparelhos de detecção semelhantes aos nossos órgãos dos sentidos.
Voltando à eletricidade e à década dos 80 do século passado, a humanidade já conhecia a bateria, o dínamo e o motor elétrico. Um pouco antes, em 1873, Z. Gramme em Viena, fez acionar um dínamo empregando uma máquina a vapor e produziu uma corrente elétrica. Coube a Thomas Edison, entretanto, a idéia de utilizar uma máquina a vapor para acionar um dínamo de dimensões gigantescas e dessa forma obter corrente que fluísse pelos fios e acendesse lâmpadas nas casas. Após várias tentativas, surgiram as lâmpadas de fios de tungstênio e finalmente, em 1883, Edison conseguiu iluminar um quarteirão inteiro de Nova Iorque com 2.300 lâmpadas. Escreveram os jornais da época: "Não mais o bruxuleio e cheiro nauseabundo dos lampiões a gás".
A demanda crescente por energia elétrica exigia maior potência da máquina a vapor para acionar os geradores de corrente alternada. No entanto, estes estavam desigualmente conjugados. Os novos geradores exigiam maiores rotações e quanto maior era a máquina a vapor, mais baixa era a velocidade de rotação. Este obstáculo foi vencido em 1891 com a invenção da Turbina a vapor por Charles Parsons. A máquina a vapor experimentava mais uma evolução importante.
Em 1889, os 50.000 cavalos que percorriam as ruas de Nova Iorque puxando bondes ouviriam o som do primeiro bonde elétrico. Para movimentar este bonde e iluminar vários quarteirões, a máquina a vapor tinha uma potência de 7.000 quilowatts e media 12 metros de altura. Três anos depois a mesma potência podia ser gerada com uma turbina a vapor de apenas um metro de altura e consumindo muito menos carvão.
Portanto, a primeira cidade a ser iluminada e a possuir bondes elétricos tinha a sua eletricidade produzida por uma estação termo elétrica. Não tardariam, contudo, a surgir as estações hidrelétricas, isto é, quando a antiga roda d'água evoluiu para a turbina hidráulica e aí tivemos pela primeira vez a produção de energia mecânica a partir de uma fonte primária de origem não biológica ou química, além do que, a água podia ser armazenada nos reservatórios e quando necessário produzia energia elétrica na estação que era transmitida através dos fios e poderia produzir iluminação, calor, comunicação e energia mecânica para movimentar os mais variados aparelhos elétricos, inclusive bondes e trens.
O século da energia ainda reservava uma evolução decisiva para a máquina a vapor: a descoberta do motor à combustão interna. Neste caso, o vapor d'água foi substituído pelos gases resultantes da queima do combustível. A idéia deste invento que poderia acionar um veículo pequeno, surgiu da necessidade de motorizar a bicicleta que, embora fosse mais rápida do que um cavalo, tinha a desvantagem de consumir a energia muscular do seu passageiro. Em 1896, Henry Ford construiu o primeiro automóvel, o qual possuía um único assento, rodas e campainha de bicicleta, porém o motor apresentava tantos defeitos e falhas e era tão barulhento e mal cheiroso que em 1900 ninguém via nele o mínimo futuro. Assim, terminava o século XIX, o século da energia.
IV - O Século XX - O Século da Informática, da Aldeia Global, da Poluição.
Caso estivéssemos vivendo a década dos sessenta, as denominações, mais apropriadas para o século XX seriam - o século do Petróleo, do Automóvel, das Metrópoles, das Megalópolis, etc.
O automóvel, bem como todos os outros veículos movidos por motores à combustão interna, embora engatinhassem no início do século, tiveram um progresso sem precedentes durante as primeiras três décadas. O petróleo, cujo primeiro poço entrou em funcionamento em 1859 (Drake, na Pensilvânia) foi utilizado, pelo menos, durante três décadas, para produzir querosene iluminante. Este substituiu os óleos de origem animal, principalmente o de baleia, na iluminação residencial e pública. A gasolina obtida juntamente com o querosene era descartada por ser muito explosiva para iluminação e não ter uso prático.
O motor a dois tempos, ciclo Diesel esperou, pelo menos, quarenta anos após a sua descoberta, para começar a movimentar caminhões, ônibus, tratores e navios. Porém, não foram somente os transportes terrestres e aquáticos que assistiram a revolução do petróleo durante as três primeiras décadas do século atual - surgiu também a aviação. A utilização do avião, mesmo na sua infância, não teve somente fins pacíficos, pois foi utilizada como arma já durante a Primeira Guerra Mundial (1914 - 1918). Segundo alguns historiadores, esta situação levou Santos Dumont, um dos pioneiros dos transportes aéreos, a cometer o suicídio. A eletricidade, durante os primeiros três decênios do século atual, continuou em progresso acelerado, porém concentrada em dois usos: produção de força motriz e de iluminação (resquícios daquela época são denominações das Companhias de Energia Elétrica de então, sempre ligadas aos nomes Força e Luz).
As grandes revoluções da Física, que passaram a ser chamadas de modernas, a partir de 1930, também tiveram grandes impactos na área energética, como a descoberta dos semicondutores que levou a do transistor, e daí para a evolução do rádio e da televisão, que inicialmente eram com válvulas (em tomo de 1940), foi um passo muito rápido. "Surgia a Era das Comunicações" que levaria MacLuhan, na década dos sessenta, a vislumbrar o mundo do futuro como o da "Aldeia Global". As transmissões via satélite, tão comuns nos nossos dias, vieram corroborar esta situação. O Planeta Terra tomou-se demasiadamente pequeno ante o arsenal das comunicações.
O petróleo suplantou o carvão mineral a partir do pós-guerra, isto é, da década dos cinqüenta e desencadeou também a explosão das Metrópoles e das Megalópolis. As estradas de ferro, com os seus trens movidos a carvão mineral entraram em declínio acentuado, principalmente nos Estados Unidos. A Europa preserva, até hoje, um sistema de transporte ferroviário bastante expressivo. O Brasil, no final da década dos quarenta, possuía pouco mais de trinta mil quilômetros de vias férreas, porém com 15 bitolas diferentes, tomando impossível as conexões e os transportes de longas distâncias.
Contudo, as estradas de ferro deixaram uma marca indelével no tipo de urbanização do nosso território até a metade do século - as estações ferroviárias constituíram-se em núcleos de assentamentos de vilas e pequenas cidades. A estação central era o centro da vila e as vias de transporte de pessoas e mercadorias se irradiavam por alguns quilômetros e eram feitas em grande parte por veículos puxados a bois ou cavalos. Com a explosão do uso do petróleo, tanto nos veículos de pequeno porte como nos ônibus e caminhões, os transportes ferroviários e fluviais entraram em acentuado declínio e as estradas asfaltadas começaram a se expandir em todas as direções. As fábricas e as vilas de operários, o comércio, etc., não teriam mais necessidade de se localizarem em eixos estratégicos, não havia mais restrições espaciais. Os tentáculos da urbe se estenderam em todas as direções, sem preocupação alguma quanto ao tipo de terreno onde se assentariam ou com as possíveis conseqüências ambientais. Havia energia barata, a do petróleo, para toda esta orgia e o meio ambiente era suposto ter uma capacidade ilimitada para suportar as agressões urbanóides.
A explosão populacional, graças aos progressos, principalmente nos campos de higiene e de prevenção de doenças, acompanhou a explosão das megalópolis. Em 1850, a população do globo era de 1 bilhão de habitantes com apenas 2,5% vivendo em cidades, em 1920 passou para 2 bilhões, em 1960 para 3 bilhões, em 1975 para 4 bilhões, e em 1990 para 5 bilhões com 70% vivendo em cidades. Alguns ambientalistas mais extremados consideram esta super urbanização como um fato positivo, pois do contrário o "bicho-homem" teria tomado o meio rural praticamente irrecuperável para suportar qualquer tipo de vida.
A construção urbana, através do uso indiscriminado dos derivados de petróleo e pela adoção inconseqüente do estilo de vida chamado "sociedade de consumo", expandiu a poluição ambiental para níveis inimagináveis para os nossos antepassados anteriores à década dos cinqüenta. Entre os três tipos extremos de poluentes: sólido, líquido e gasoso, este último escapa a qualquer tipo de controle - a não ser que se elimine de uma forma radical, o uso dos derivados de petróleo.
No final do século XX, tendo uma enorme dificuldade em indicar para que lado o prato da balança das conquistas científicas e tecnológicas pende, quando comparado com a poluição e a qualidade de vida. As grandes cidades perderam a sua magia de atração como centros de lazer e de cultura. São apenas sufocantes locais de trabalho e de moradia. Em cada fim de semana ou feriado, contemplamos a debandada desenfreada dos urbanóides em busca de locais mais tranqüilos e mais saudáveis junto à natureza e, de preferência, o mais distante possível do próprio homem. O homem tornou-se, através do uso dos veículos automotores, que permitiu velocidades perigosas através das ruas e estradas asfaltadas, no principal predador de sua própria espécie e também de muitas outras espécies indefesas como a dos cães. No caso brasileiro, a indústria automotora incluindo todas as suas possíveis ramificações (refinarias, postos de distribuição de combustíveis, indústria pneumática, de peças, etc.), emprega cerca de 30% de toda a força de trabalho. Esta situação nos levou a uma fabulosa "embretada". É bem verdade que a nascente indústria da informática apresenta um potencial fantástico para a absorção de mão-de-obra, porém esta é muito mais qualificada e seletiva do que a anterior.
V - Alguns Cenários para o Brasil do Século XXI
Tudo indica que o uso indiscriminado dos derivados de petróleo nos veículos automotores terá o seu declínio antes que as reservas do "ouro-negro" tenham a sua exploração economicamente inviabilizada. Os combustíveis derivados da biomassa: etanol, metanol, óleos vegetais, etc., prenunciam uma era de transição para o motor à combustão interna. Neste caso, a poluição gasosa é menor do que a dos derivados de petróleo, porém nunca será eliminada na sua totalidade.
Por outro lado, a eletricidade veio para ficar e as tecnologias deste século apontam para um futuro muito promissor para a produção diversificada deste energético - o mais versátil de todos. As tecnologias de conversão das fontes renováveis de energia em eletricidade nos dão garantia de suprimentos fantásticos para o próximo século. No caso brasileiro onde a produção de eletricidade é cerca de 80% de origem hídrica (muito mais limpa e eficiente do que a produzida via combustíveis fósseis e nucleares) nos indica um caminho inequívoco para seguirmos. Também as usinas solares e a biomassa que convertem a energia térmica em eletricidade começaram a substituir com grandes vantagens ambientais as suas congêneres alimentadas por combustíveis fósseis e/ou nucleares. Quanto à conversão direta da energia solar em elétrica (fotovoltaica) há fortes prenúncios de que mesmo antes do final do século tornar-se-à economicamente viável através do uso do silício amorfo em vez do monocristalino. A conversão de energia eólica em eletricidade deu passos gigantescos nas duas últimas décadas e, hoje, turbinas eólicas que convertam qualquer energia dos ventos (velocidades variáveis) em energia elétrica são uma realidade tecnológica. Todas essas formas de energia renováveis, derivadas do sol, que ainda vai durar como estrela cerca de 5 bilhões de anos, são abundantes em nosso país.
Dessa forma, não só a energia elétrica para todo o conforto possível dos nossos lares e locais de trabalho e para as comunicações da futura sociedade descentralizada da "Aldeia Global", têm suprimento garantido. Também os transportes poderão se tomar predominantemente elétricos, tanto para pessoas como para mercadorias, através de trens, metrôs e ônibus elétricos, e também para os veículos de pequeno porte. É importante ressaltarmos o aspecto ambiental deste tipo de transporte futurístico - a conversão de fontes renováveis de energia em elétrica são as que apresentam os menores danos ambientais em relação as "energias duras", mais utilizadas nos dias de hoje. Também a conversão da energia elétrica em mecânica e vice-versa para qualquer tipo de deslocamento oferece um alto rendimento, pelo menos 80%, o que é fantástico quando comparada com a conversão da energia química dos combustíveis em elétrica (usinas termelétricas) que se situa no máximo em 30%, uma vantagem ambiental indiscutível.
Resumindo, entre os muitos cenários para o Brasil do século XXI, podemos antever o seguinte: as grandes distâncias cobertas por trens elétricos ou por via hídrica. Os transportes de carga e coletivo, mas em escala muito menor, de pequenas distâncias, até estações de trens, poderão ser feitos com combustíveis derivados de biomassa. Note-se que em ambos os casos o motor à combustão interna vai continuar existindo (transporte hídrico e pequenas distâncias via terrestre). Por fim, o transporte individual será energizado por eletricidade via baterias, e quem sabe, pelo tipo híbrido elétrico-volante mecânico. A energia elétrica será produzida de uma maneira diversificada e descentralizada desde os telhados das casas cobertos com painéis fotovoltaicos, colinas, praias, montanhas, etc., com turbinas eólicas e todas as possíveis quedas d'água aproveitadas com micro, mini e pequenas centrais hidrelétricas. Também as pequenas centrais termelétricas à biomassa farão parte importante das nossas paisagens rurais. Tudo indica que este cenário não é só desejável ecologicamente como também muito provável de se materializar técnica e economicamente.
sábado, 29 de novembro de 2008
Energia e Transportes através dos tempos
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Um comentário:
Estou escrevendo um projeto jovem pesquisador e gotaria de saber se vcs querem participar. É sobre energia solar fotovoltaica e assunto relacionados.
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